Eram os últimos dias de intercâmbio do Gabriel na Califórnia, por isso eu e o Genki decidimos pegar uma carona, saindo de Huntington Beach até Los Angeles, para podermos passar o último fim de semana juntos, como havíamos feito durante todo o verão.
Mas o que há para fazer em Los Angeles? Eu te respondo: há cerca de um trilhão de coisas que você pode ver e fazer. Mas por que não se submeter ao clássico? Visitar todos os pontos turísticos que já conhecemos de cor e vimos em muitos filmes. Bom, decidimos assumir o papel de bons turistas durante aquele fim de semana. Comprometidos, disciplinados e previsíveis. Acho que você consegue adivinhar rapidamente o nosso itinerário. Aqui vai ele:
Beverly Hills, Rodeo Drive, Calçada da Fama, Griffith Observatory, Cheesecake Factory e um hostel na Melrose Avenue, no qual eu fiquei trancada para o lado de fora com meu amigo japonês e um desconhecido nervosinho.
Aaahhhh, eu não te disse? Previsível.
Assim começou o dia que proporcionou este belo e caótico episódio. Encontramos Gabriel pela manhã no hostel que fica na Melrose Avenue. Eu sempre quis conhecer essa região de L.A., pela atmosfera que une o clássico e o alternativo. Com as boutiques, os brechós, os restaurantes e as pessoas “descoladas”. Genki e eu decidimos ficar hospedados ali durante aquele fim de semana.
A nossa primeira parada foi em Beverly Hills. Acredito que há gosto para tudo, mas, honestamente, não há muito o que ver por ali além de casas bonitas e aquela placa gigante no chafariz em que todo mundo adora tirar foto. É verdade, dá uma olhada no seu Instagram.
De lá, é fácil chegar até a Rodeo Drive, o quarteirão com as lojas mais caras do mundo. Se você é um grande admirador dos filmes dos anos 1990 e início dos anos 2000, como eu, ver de perto o Hotel Beverly Wilshire, onde foi gravado o filme Uma Linda Mulher, vai te dar borboletas no estômago.
Mas podemos dizer que para fazer compras ali, você precisa preencher alguns requisitos: ser alguém conhecido publicamente, adorar comprar na Rolex ou ser membro de uma família árabe que provavelmente pode pagar tudo à vista. Claramente, meus amigos e eu não nos encaixamos em tais requisitos. Então demos uma olhada em volta e partimos para o ponto turístico número dois da lista: a Calçada da Fama.
Há controvérsias sobre ela, eu sei. Porém, vá e veja com seus próprios olhos. Talvez ela seja mais bonita e glamourosa nos filmes e nas fotografias? Talvez. São muitas pessoas circulando por ali? Com certeza. E muitas estrelas? A-HAM! E a maioria você não vai nem saber quem é. Há muito de muito acontecendo ali. Inclusive muitos cheiros. Mas não importa o que aconteça, ela ainda é a Calçada da Fama!
Uma viagem rápida de metrô e… ponto turístico número três, aqui estamos nós! Essa foi a minha primeira vez no Griffith Observatory à noite, e parecendo ser impossível, a vista passou a ser mais impressionante do que já era para mim.
Era uma terça-feira, e nessa noite estava sendo possível enxergar um planeta e várias estrelas pelo telescópio. Por isso, uma grande fila estava sendo formada no telhado do observatório. E, você sabe: uma multidão, fila, telescópio de graça e estrelas. Como turistas comprometidos, entramos na fila e fomos checar o céu daquela noite.
O telescópio era gigantesco, por isso era preciso subir as escadas para alcançar a lente. Um dos funcionários explicava o que veríamos no céu, para que pudéssemos identificar quando chegasse a nossa vez no aparato tecnológico.
O planeta (cujo nome não lembro agora, ops!) parecia para mim uma lanterninha piscando perto de outras lanterninhas com bateria mais fraca em um fundo azul-escuro. Foi a minha primeira vez vendo os astros tão de perto, e acho que a dos meninos também. É cafona, eu sei, mas teve algo de especial em compartilhar essa primeira vez com eles.
Tivemos o que seria um jantar de despedida, mas sem a parte pomposa e chique da frase. Éramos só nós três comendo macarrão juntos. Imagine esse momento assim: Genki, Gabriel e eu no Cheesecake Factory e o garçom se confundindo com os pedidos. E nada pode fazer um jovem japonês mais desapontado do que isso, especialmente se ele for o Genki. Foi um daqueles dias divertidos que passamos juntos. Depois disso, nós nos abraçamos e nos despedimos.
Já era mais de meia-noite, ou seja, já tinha passado da hora do toque de recolher quando chegamos à porta do hostel. Precisávamos digitar uma senha para podermos entrar no prédio, e neste ponto da história acho que você já pode adivinhar o que aconteceu.
A senha era a correta, mas as trancas da porta do prédio não abriam.
Junto a nós dois, surgiu um garoto que também se hospedaria no hostel naquela noite, e não conseguíamos contactar ninguém do staff para avisar que estávamos presos do lado de fora. A rua estava deserta e escura, o telefone não chamava, a senha correta não destrancava a porta, e os nossos gritos não pareciam ter nenhum efeito – a não ser incomodar os moradores das residências ao redor.
Genki começou a engatar uma conversa em japonês com o garoto nervoso, que não fazia nada além de reclamar e bater na porta. Gritar como loucos parecia não adiantar muito, mas era a nossa única e melhor opção no momento.
Depois de muito tempo, não uma, mas duas luzes no fim do túnel usando pijamas e falando francês acordaram com os nossos berros e vieram saber o que estava acontecendo. Expliquei toda a situação para o casal recém-casado que também estava hospedado no hostel. Eles nos perguntaram a senha e decidiram confiar nas três pessoas desesperadas que éramos. Graças a Deus!
Dizer que eu pensei que fosse morrer talvez seja um exagero da minha parte, mas você sabe que eu exagero até nas vírgulas. Mesmo sem entender muito bem o que estava acontecendo, eu tenho certeza que o Genki concordaria comigo e cogitaria participar do meu plano de sobrevivência: um dormir primeiro enquanto os outros dois fariam de tocaia durante a noite.
Neste momento, eu pulo para a parte de uma boa noite de sono em um dos hostel mais confortáveis e descolados em que eu já estive. O nome dele é The Steady Hostel. Um café da manhã hipster com o Genki no Squirl e o Gabriel atrasado para irmos para o aeroporto.
Foi engraçado ver naquele instante que cada um seguiria para um destino diferente. O Genki continuaria explorando Los Angeles e acabaria conhecendo uma garota no píer de Santa Mônica que o faria comprar uma camiseta para ela. Eu embarcaria no meu primeiro voo nacional dentro dos Estados Unidos da América, indo para Michigan. E o Gabriel voltaria para casa, a cidade cheia de prédios e movimento que ele tanto amava, mais conhecida como São Paulo.
Eu não sei você, mas para mim tem algo extraordinário nessas idas e vindas, nas pessoas em que esbarramos durante nossas escolhas e nas amizades que ficam. Nós ainda somos amigos. Eu troco mensagens com o Genki, que agora está no Japão, acordando quando eu estou indo dormir. O Gabriel e eu já nos reencontramos em São Paulo, e esporadicamente debochamos um do outro, como nos velhos tempos.
Acho que ficar trancada do lado de fora de um hostel na madrugada, sem nenhum sinal de resgate, faça sentido quando se teve um dia com boas companhias ao seu lado.
Mas, por favor, não fique trancado para o lado de fora de um hostel na Melrose Avenue!