O estado da Flórida, nos EUA, sempre foi vítima de fenômenos climáticos intensos, como furacões e inundações em dias de sol; mas, devido a falta de ações voltadas ao combate das mudanças climáticas, hoje em dia a própria existência de Miami está ameaçada. Considerado o “paciente zero” das catástrofes ambientais, o sul da Flórida vem sofrendo os piores efeitos desde muito antes do resto do país. 

A previsão é de que o nível do mar suba cerca de meio metro nos próximos 40 anos, e que, dentro de um século, a cidade inteira venha a ser engolida pela água salgada. David Wallace-Wells, jornalista da New York Magazine, comenta em uma extensa reportagem sobre o tema que “muita gente fala de Miami e Bangladesh como se as cidades tivessem uma chance de sobreviver”, mas que “a maioria dos cientistas com quem [ele falou] presumem que vamos perdê-las até o fim do século mesmo se pararmos de consumir combustíveis fósseis”. 

Estudos conduzidos em 2019 pelas autoridades ambientais dos condados de Miami-Dade, Broward, Monroe e Palm Beach indicam que, em 25 anos, o nível do mar no sul da Flórida subiu cerca de 12 centímetros. O mesmo estudo diz que, nos próximos 15 anos, ele pode subir a mesma quantidade ou mais.

 

Mudanças climáticas: um problema histórico em Miami

 

Desde a década de 1920, quando o empreendedor Carl Fisher resolveu remover a vegetação de mangue em uma ilha-barreira (uma faixa de terra natural paralela à costa), preencher uma parte do espaço entre a ilha e o continente com calcário e areia e assim criar Miami Beach a partir de um terreno impróprio para habitação, as inundações se tornaram parte da rotina dos novos moradores. Fisher conseguiu o que queria,  atraindo os recém-chegados com a promessa de viver em um paraíso tropical à beira da praia, e sua companhia faturou cerca de US$ 24 milhões em imóveis em 1925. 

Por ser originalmente terra de manguezal, Miami Beach regularmente passa por fenômenos conhecidos como “king tides”. Isto é, as marés mais altas do ano que acontecem de uma a duas vezes anualmente; durante as king tides, as ruas ficam alagadas, estacionamentos transformam-se em aquários e a água do mar corrói os alicerces dos prédios. O edifício Champlan Towers South, construído na década de 80 na cidade de Surfside, vizinha de Miami Beach, colapsou em junho de 2021 após décadas de corrosão. 

 

Colapso do Champlan Tower South. Foto: Reprodução/Sun Sentinel/Amy Beth Bennett.

 

E não é só a ilha-barreira que sofre: no continente, os moradores de Miami vêem a água invadir as ruas diretamente do chão. Isso é porque a base rochosa da cidade permite a entrada da água do mar por debaixo da superfície do solo.

Segundo a Agência de Proteção Ambiental, essa situação de “níveis extremos” serve como uma previsão do que uma maré alta comum virá a ser. Conforme o nível do mar sobe, o alagamento acontece com mais frequência com as king tides. Aliás, os alagamentos já acontecem hoje cerca de quatro vezes mais do que há 15 anos.

Ainda assim, a cidade não pára de atrair novos moradores, em especial da elite estadunidense. Entre 2020 e 2021, a Flórida foi o estado que mais recebeu compatriotas: cerca de 221 mil pessoas. Cada vez mais, as comunidades latinas, negras e caribenhas, que foram obrigadas a se estabelecer nas porções de terra mais elevadas, terão seus lares visados.